(você pode ler ouvindo Joe Cocker)


Eu nunca pude fazer nada e isso ainda arde no peito.
Ainda sinto o dia que você partiu aqui, como se fosse ontem, sinto-o vivo. Cada segundo daquele dia, o cheiro da grama molhada no ponto de ônibus, o céu limpo e azul, o sol forte, mas o vento gélido, mostrando que a qualquer momento poderia chover. E choveu. A chuva não veio do céu, dessa vez veio em formato de lágrimas - escorrendo pela minha face, dispersando-se por todos os lados, bochechas, lábio, pés e a grama. Até hoje, não sei se a grama estava verde pela chuva que havia caído naquela semana ou se chorei tanto que não conseguiram secar. Exagerada? Sempre. Mas foi assim que me senti aquele dia. Passei horas caminhando sem rumo pela cidade porque eu sabia que chegar em casa e não ter você seria muito doloroso.
Sei que eu tomei a decisão de não entrar naquele ônibus. E em todos os outros com destino ao nosso amor. Meu coração com destino ao teu. Não entrei nesse ônibus. Não me juntei a você. E essa foi apenas a primeira vez em que, por culpa da minha falta de fé no amor, do meu medo de abandonar tudo pra viver ao teu lado, fizeram-me perder a chance de ficar pra sempre ao seu lado. Tivemos muitas outras chances depois, em todas eu congelei. Nunca vou esquecer do teu olhar para mim, quando estávamos no banquinho lá do alto daquele pequeno morro, onde podíamos avistar boa parte de Goiânia, aquele seu olhar de quem espera que dessa vez vá dar certo - dessa vez ela vai ter coragem o suficiente - não tive. Ou quando eu simplesmente não entrei mais uma vez eu não peguei aquele voo pra ir te encontrar e conversarmos. Eu sabia o que você diria. Eu sabia que você estava pronto para viver aqueles nossos sonhos. Correção: seus sonhos. Porque eu nunca os sonhei, não é? Sinceramente, bora bora nunca foi o meu sonho de lua de mel, eu não queria um labrador, quanto aos filhos... Eu, tinha apenas 16 anos, não pensava em filhos. E agora, quase dez anos depois eu desesperada para tê-los. E, talvez, nunca os tenha. Sei que não será com você. Essa é a minha única certeza hoje: Nada mais será com você. Porque eu já perdi todos os ônibus e vôos possíveis. E outra o pegou, certamente. Se eu me arrependo? Talvez.
Talvez eu pense um pouco na nossa casa com gramado verdinho, com um quintal enorme onde as crianças poderiam correr e brincar com o nosso labrador. Talvez eu delire de vez em quando com nossas viagens a Bora Bora e Coimbra. E com a sua toga negra pendurada ao lado do meu jaleco branco no armário, a nossa biblioteca enorme onde você vai passar longas horas estudando e escrevendo para mim. Nossos três filhos pendurados em você quando eu chegar de um plantão exaustivo, e a unica coisa que pensaria seria em me juntar a vocês na brincadeira qualquer que fosse. É, talvez eu pense um pouco na vida que eu abri mão, talvez eu sonhe um pouco com uma vida assim hoje.

Arrependo-me de não ter ido na primeira vez. As vezes, me pego pensando em como teria sido se eu fosse até o aeroporto. Eu choraria? Acho que não. Naquela época eu era mais forte. Jamais choraria em sua frente. Eu te pediria pra ficar? Você me convenceria a entrar no avião? Talvez tentaria. Me diria o quanto eu amaria o Rio e me pediria pra embarcar. Eu teria coragem? Gostaria de ter sido essa pessoa corajosa, não fui. Nunca fui corajosa com você. Nunca me esforcei para ser. Mas quer saber, talvez seja melhor assim. Porque, apenas hoje, eu descobri que nós jamais viveríamos aquela vida que você desejava pra nós. Porque mesmo eu te amando profundamente e você sonhando todos esses sonhos para nós, você nunca foi o amor da minha vida. Você foi apenas um grande amor, talvez tenha sido até o mais bonito, mas apenas isso não basta.  O tempo passou e eu vivi a vida da melhor maneira que eu deveria tê-la vivido, só então eu compreendi o porquê de eu nunca ter sido corajosa o suficiente para amar você. 
Grandes amores épicos juvenis não foram feitos para durar mais do que quatro dias, Romeo e Julieta que o diga. Ainda duramos o bastante.
Espero que você também entenda.

Não mais sempre sua, ex namorada.







- Luíza Moura